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Golden Hour? – Tempo de Atendimento Pré-Hospitalar e Mortalidade em Vítimas de Trauma

Hoje trataremos de algo extremamente necessário para o entendimeto de profissionais que atuam no atendimento pré-hospitalar: compreender a necessidade de não perder minutos importantes na cena com intervenções que podem não ser benéficas e que podem impactar na sobrevida do paciente vítima de trauma no pré-hospitalar. Comentem como está a realidade de vocês nessa questão fundamental. Boa leitura!

Criado em meados dos anos 70 do século passado, o termo “golden hour” (do inglês: hora de ouro) é definido como aquele período crucial (que não necessariamente é de 60 minutos) para intervenções que podem aumentar a chance de sobrevida de um paciente traumatizado grave1. Sabe-se que boa parte das vítimas graves de trauma que não morrem imediatamente ao trauma, vão morrer pouco tempo depois , em sua maioria, por choque hemorrágico.

A partir daí, aninda observam-se nos dias de hoje, discussões sobre qual seria a maneira mais adequada de atender esse grupo de pacientes no ambiente pré-hospitalar. A conhecida dicotomia “scoop and run” (algo como pranchar e correr, em tradução livre) versus “stay and play” (permancer na cena e intervir, também em uma tradução livre)2 em geral expõe, respectivamente, as formas de atendimento em sistemas pré-hospitalares de emergência baseados na atuação de paramédicos (como nos EUA) e de sistemas com médicos nas equipes (como em alguns países da Europa aqui no Brasil).

Intervenções como intubação traqueal, instalação de acessos venosos para infusão de soluções cristalóides e/ou de drogas, além de imobilizações ocorrem quase sempre no paciente traumatizado grave durante o atendimento pré-hospitalar (APH). Questiona-se se intervenções dessa natureza não consumiriam um tempo considerável do APH, podendo, desa forma, aumentar a mortalidade dessas vítimas.

Daí surge a pergunta : como equilibrar o peso de uma intervenção em benefício do paciente com o tempo gasto para realiza-lá?

Já que o Sistema de Emergência Pré-Hospitalar adotado aqui no Brasil dispões de médicos nas equipes de suporte avançado de vida, podemos usar exemplos de sistemas parecidos que existem em outros países para tentar responder à essa pergunta.

Em setembro de 2019, Gauss et al.3 publicaram o seguinte artigo:

É um estudo observacional (coorte) que utilizou dados coletados prospectivmente de dois registros multicêntricos de Trauma na França: o TraumaBase (região urbana em Paris e entorno com uma população de 12 milhões e 15 milões de visitantes por ano) e TRENAU (região rural e de montanha nos Alpes franceses com uma população de 2 milhões de pessoas e 8 milhões de visitantes por ano).

A hipótese do estudo foi de que um tempo total prolongado de APH em vítimas traumatizadas graves estaria associado a um aumento da mortalidade intra-hospitalar. Os pacientes foram atendidos no ambiente pré-hospitalar pelo SAMU francês (que também possui médicos tripulando as ambulâncias como parte da equipe de suporte avançado de vida) em ambas as regiões mencionadas anteriormente.

O tempo total de APH (TTAPH) foi calculado a partir do horário da chegada na cena de APH atéo horário da chegada no hospital de destino ds vítimas de trauma.

10.216 adultos atendidos pelo SAMU francês foram incluídos foram incluídos na análise. A média de idade foi de 41 anos. 78% dos pacientes eram do sexo masculino. 91,5% foram vítimas do trauma contuso com um ISS (Injury Severity Score) médio de 17 (para saber mais sobre a ISS clique aqui). 55% foram vítimas de acidentes de trânsito e 30% de quedas. 1259 pacientes (12,4%) apresentam PAS < 90 mmHg E 2724 pacientes (26,9%) tiveram TCE grave. 73,4% dos pacientes foram transportados por ambulância terrestre. 89,8% foram admitidos no centro de trauma de referência . 2321 (23%) pacientes foram submetidos à intubação traqueal na cena.

A mediana do TTAPH em ambos os registros foi de 65 minutos (As medianas de TTAPH apenas do TraumaBase e do TRENAU foram de 73 minutos e de 60 minutos, respectivamente). 4067 pacientes (40,2%) tiveram um TTAPH menor do que 60 minutos.

Como pode ser observado na atabela abaixo, à medida em que o TTAPH aumenta, a porcentagem de óbitos também aumenta. Portanto, nesse estudo, houve uma associação do aumento da mortalidade das vítimas de trauma com o prolongamento do TTAPH.

Também foi visto que a cada 10 minutos a mais no TTAPH as chances de óbito aumentaram em 9%  [OR 1,09 IC 95% (1,07-1,11)].

Os autores discutem que “embora o TTAPH tenha sido considerado uma variável independente para aumentar a mortalidade intra-hospitalar, ele permance dependente de outras variáveis como alterações fisiológicas do paciente, a gravidade das lesões e as intervenções realizadas no APH”.

É poposto então que seja superada a dicotomia “scoop and run” versus “stay and play” com uma relação entre o tempo despendido na cena e as intervenções realizadas para atender ás necessidades críticas dos traumatizados graves. Essa relação tempo-intervenção implica que o tempo necessário para cada iintervenção no APH seja adaptado a cada paciente e compensado por seu potencial ganho na sobrevida da vítima. Exemplos de situações que a relação tempo-intervenção implica que o tempo necessário para cada interveção no APH seja adaptado a cada paciente e compensado por seu potencial ganho na sobrevida da vítima.

Exemplos de situações que a relação tempo-intervenção é otimizda:

a) paciente com a pelve instável sendo uma possível fonte de sangramento que está causando um choque hemorrágico e a intervenção imediata é a imobilização pélvica com rápido transporte desse paciente para um centro de trauma;

b) hemorragia exsanguinante por um trauma em um membro e a conduta imediata é a utilização de um torniquete com transporte rápido ao centro de trauma.

Uma limitação importante do estudo foi que somente pacientes que chegaram vivos nos centros de trauma foram incluídos, o que pode gerar um viés de seleção, visto que os pacientes que chegaram vivos nos centros de trauma foram incluídos, o que pode gerar um viés de seleção, visto que os pacientes que morrem mais precocemente na cena poderiam impactar na associação TTAPH e mortalidade.

Referências:

  1. Ellis R, Wick P. 2018. PHTLS: Past, Present and Future. In: PHTLS – Prehospital Trauma Life Support. 9th edition. Burlington, Massachusetts: Jones & Bartlett Learning;
  2. Maegele M. In Acute Trauma Care, Time Matters but is not Everything. JAMA Surg 2019 Sep 25 [Epub ahead of print];
  3. Gauss et al. Association of Prehospital Time to In-Hospital Trauma Mortality in a Physician-Staffed Emergency Medicine System. JAMA Surg. 2019 Sep 25 [Epub ahead of print].

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